Augustin Souchy Bauer (1892-1984)
foi um militante anarquista alemão. Viveu na Suécia, Espanha, França, México,
Cuba, entre outros lugares, desenvolvendo uma intensa militância anarquista em
todos os países em que residiu, chegando a trabalhar com anarquistas como Rudolf
Rocker, Piotr Kropotkin e Buenaventura Durruti.
Iniciou sua militância atuando
na União Socialista Libertária de Berlim (impulsionada
por Gustav Landauer), em 1912, mesma data em que inicia sua
colaboração na imprensa libertária.
Em 1914, durante a primeira guerra
mundial, se refugia na Suécia, onde também é perseguido. Em Estocolmo, entre
outros militantes socialistas, conhece Vladimir Ilitch Lenin.
Em 1917, no desenrolar da revolução
russa, publica um folheto intitulado “A Ditadura & O Socialismo”,
onde rechaça a idéia da ditadura como instrumento da revolução social. Em 1919,
retorna para Berlim, onde torna-se um dos editores do periódico
libertário Der Syndicalist (entre 1922-1933).
Em 1921, viaja para a Rússia,
como membro da União Livre dos Trabalhadores da Alemanha (F.A.U.D.),
assiste (enquanto observador) a fundação da Internacional Sindical
Vermelha (Profintern), onde conhece dirigentes bolchevistas como Karl
Berngardovitch Radek, Grigori Yevséievich Zinóviev, Anatoli
Vasilevitch Lunatcharski, Nikolái Ivánovich Bujarin, entre
outros, que mais tarde serão assassinados por ordem de Iósif
Vissariónovich Stalin. Nessa mesma viajem conhece Piotr Kropotkin,
com o qual pode conviver durante alguns dias.
Entre 1920/1921, participou da
reorganização da Associação Internacional dos Trabalhadores (A.I.T.),
na qual atuou intensivamente até o advento do nazismo, quando se viu obrigado a
refugiar-se na França em 1935.
Em 1936, ao ter notícias sobre
a guerra civil espanhola, Augustin Souchy, então com mais de 40 anos, foi
voluntariamente lutar na Espanha. Participou da Confederação Nacional
do Trabalho (C.N.T.), atuou nas frentes de batalha até ser ferido
gravemente. Passou para a retaguarda, onde dirigiu o Serviço
Internacional de Informação e Propaganda sobre o avanço do povo
espanhol contra o totalitarismo fascista. Nesse período, publicou um dos seus
livros mais conhecidos “A Semana Trágica em Maio” (ainda não lançado no
Brasil), um dos poucos relatos de primeira mão, sobre as jornadas de Maio de
1937, na Espanha.
Após a implantação da ditadura
franquista na Espanha, Souchy passa para um campo de refugiados na França, até
que em 1942, se refugia no México.
Em 1948, se desloca para Cuba
com a finalidade de participar ativamente no projeto anarquista naquele país.
Em 1950, viajou para Israel, onde estudou os Kibbutzim (coletividades
comunitárias) como experiência coletivizadora.
No fim da década de 1950,
realizou uma seqüência de conferências pela América do Sul com o intuito de alavancar
o sindicalismo, chegando à passar pelo Brasil (Novembro de 1959), em evento
organizado pelo Centro de Estudos Professor José Oiticica (C.E.P.J.O.),
no Rio de Janeiro.
Em 1962, a Editora
anarquista Germinal (Rio de Janeiro), publicou o livro “O
Novo Israel” de Augustin Souchy no Brasil. Em 1963, a Organização
Internacional do Trabalho contratou-o como perito em educação.
O militante português Roberto
das Neves (que viveu no Brasil e foi fundador da Editora
Germinal), conheceu Souchy, ainda durante a época da revolução
espanhola, e sobre ele escreveu o seguinte: “Augustin Souchy (...)
trocando com facilidade a pena pelo fuzil e vice-versa, segundo as exigências
da (...) liberdade (...)”.
Apesar de sua intensa
militância anarquista em várias partes do mundo, e de seu extenso trabalho como
periodista e escritor, pouco se conhece do seu pensamento e de sua obra no
Brasil. Resolvemos divulgar o texto abaixo, pois o mesmo faz uma interessante
análise do socialismo e da política internacional no período pós-segunda guerra
mundial e entendemos que boa parte da reflexão de Augustin Souchy ainda
tem muito a contribuir conosco nos dias atuais, inclusive, com as últimas
manifestações que tem ocorrido no Brasil.
Que podemos esperar do movimento social ?
No movimento social existem,
desde sua origem, duas tendências: uma acena aos trabalhadores a fim de que
realizem sua emancipação através da sua intervenção e da sua ação direta
coletiva; a outra pede ao povo seus votos em favor dos candidatos socialistas
para que estes transformem, por vias parlamentares e legislativas, a sociedade
capitalista em uma sociedade socialista. Também existe uma terceira tendência
que aceita tanto a tática reformista como a revolucionária, segundo as
circunstâncias. À primeira tendência pertencem os libertários e os
anarco-sindicalistas; à segunda e terceira os marxistas de todas as escolas. A social-democracia
alemã e os social-democratas de todos os países representam a ala moderada, os
bolchevistas e os comunistas a ala radical do marxismo.
Depois da primeira guerra
mundial, os socialistas tiveram a oportunidade de realizar as suas idéias. Os
bolchevistas russos e os social-democratas alemães galgaram o poder em virtude
de revoluções populares. Os ideais socialistas se condensaram em fórmulas
concretas e as teorias começaram a se pôr em prática. Os
governantes social-democratas e os comunistas elaboraram novas constituições e
leis. Os comunistas russos pretenderam realizar uma obra completamente
inovadora, estabelecendo a propriedade estatal da terra e dos meios de
produção, no lugar da propriedade privada. Os social-democratas alemães
limitaram-se a promulgar uma constituição democrática e a fixar garantias
legais para o direito de organização e de greve, ampliando a legislação social em vigor. Nos anos
posteriores, os partidos operários chegaram ao poder em alguns outros países,
por meio de vitórias eleitorais. Em nenhum deles, porém, se atreveram a
transformar o sistema capitalista em um sistema socialista. Limitaram-se a
elaborar leis destinadas a promover o progresso social dentro da sociedade
capitalista. O partido trabalhista da Grã-Bretanha tomou um caminho “sui generis”, criando uma legislação de
seguro social que compreende a nação inteira e adotando, ao mesmo tempo, uma
decisão parlamentar em virtude da qual o Estado adquiriu as grandes
propriedades privadas, como o Banco da Inglaterra, as minas, as estradas de
ferro e outras importantes indústrias, substituindo assim, em grande parte o
capitalismo privado pelo capitalismo estatal.
Estas medidas tiveram como
conseqüência uma certa alteração estrutural do Estado e da economia. O Estado
liberal do século passado deixou de existir. Seu sucedâneo moderno é como se
fosse um empresário econômico e comercial, assim como que uma organização de
seguro social. A legislação social também foi adotada no clássico país do
capitalismo privado, nos Estados Unidos, onde, sob a presidência de Roosevelt
se legislou sobre indenizações estatais aos trabalhadores em casos de doenças,
velhice e desocupação. É assim como certas reivindicações socialistas do século
passado foram realizadas dentro do regime do capitalismo privado. As injustiças
mais flagrantes foram atenuadas, o que tinha que dar como resultado que o
descontentamento de certas camadas sociais também viesse a diminuir. Entre os
defensores do capitalismo há elementos inteligentes que sabem dirigir o barco
social com a habilidade de um piloto experimentado que sabe evitar os escolhos
e as rochas perigosas e conduzi-lo para as águas tranqüilas da evolução
pacífica. Graças a essa habilidade de manobra conseguiram manter o sistema do
capitalismo privado, cujos alicerces ainda não estão profundamente abalados,
não obstante as guerras e revoluções até hoje ocorridas.
Esse estado de coisas tinha que
produzir forçosamente certas repercussões na mentalidade dos povos, criando
determinadas disposições psicológicas na classe trabalhadora. O evangelho
socialista perdeu grande parte do seu poder de sugestão. A situação
político-social existente nos países orientais da Europa, com as chamadas
“democracias populares” e o seu capitalismo estatal que oprime e explora as
massas mais que o capitalismo privado, muito contribuiu para desacreditar a
ideologia socialista em geral.
O sistema do capitalismo estatal
criou uma ideologia totalitária que não permite qualquer oposição. Os sistemas
de opressão e repressão são de uma brutalidade quase sem precedentes. Além
disso, deu lugar a uma categoria de elites estatais, tal como na antiga
Esparta. O abismo psicológico entre o Oriente e o Ocidente se alarga cada vez
mais. A juventude da União Soviética não sabe o que é a liberdade; e as novas
gerações dos países “democráticos populares” também não têm a oportunidade de
se formar uma concepção da liberdade individual, educadas, como são, num
espírito de submissão ao Estado nacionalista. A liberdade presenteada não pode
ter valor, nem consistência e só as liberdades conquistadas pelo esforço
consciente e voluntário realizam a dignidade do indivíduo.
Nos países ocidentais, onde o
Estado apenas controla uma parte da economia, a mentalidade popular ainda não
está inteiramente fundida no molde estatal, ainda há, felizmente, certa
independência de critério. Os trabalhadores aceitam as vantagens do seguro
social, porém, geralmente não se sentem submetidos perante o Estado patrão. Não
vacilam em se declarar em greve contra o mesmo, quando os seus interesses de
produtores assim o exigem, coisa inimaginável nos países totalitários, tanto por
razões de força estatal, como pelos resultados de uma escravidão voluntária,
conseqüência, por sua vez, de uma educação toda especial. Nos últimos tempos,
os funcionários estatais em França, declararam freqüentes greves, assim como
também os estivadores de Londres, não obstante a hostilidade do governo
laborista contra essa medida. Nos Estados Unidos, a luta dos trabalhadores das
vigas de aço, conduzida com o fim de conquistar pensão para a velhice, é um
fato também sintomático. A pensão para a velhice constitui uma parte do
programa do socialismo reformista. Não obstante, o movimento sindical é, na sua
maioria, contrário a toda a idéia de estabelecer um regime socialista,
limitando-se a lutar para obter melhores condições de vida dentro do
capitalismo. Todas essas lutas demonstram que os trabalhadores dos países
ocidentais têm mais possibilidades de adquirir vantagens sociais que os seus
irmãos de classe nos países das chamadas democracias populares do leste
europeu.
As conclusões que desses fatos se
derivam, são claras: a transformação da propriedade privada em propriedade
estatal não elimina a exploração capitalista; o capitalismo estatal não
proporciona aos trabalhadores melhores condições de vida, em comparação com o
capitalismo privado. O antagonismo de classes, a existência de exploradores e
explorados, é manifesta sob ambos regimes. O capitalismo estatal não fornece
aos trabalhadores melhorias econômicas e ainda os priva de uma relativa
liberdade de ação. Isto é uma prova flagrante de que a liberdade e o bem-estar
formam um conjunto indivisível: uma não pode existir sem o outro.
Como conseqüência das más
condições econômicas e da opressão política reinante nas “democracias
populares”, observa-se certo pessimismo nos ambientes do movimento social
proletário. As últimas eleições parlamentares na Áustria, Alemanha e Noruega
foram terríveis derrotas para os comunistas. Os social-democratas conseguiram
manter sua posição devido ao seu programa simplesmente reformista, que oferece
vantagens inclusive à classe burguesa. Esse setor político já não vê no
capitalismo o seu inimigo mortal e não sente o menor desejo de propagar uma
verdadeira transformação da sociedade. Depois da segunda guerra mundial não
houve revoluções surgidas dos povos. Todas as transformações efetuaram-se pelas
autoridades, de cima para baixo. E essas alterações não afetam o regime
capitalista no seu fundo social. A exploração capitalista trocou de formas,
porém, continua mantendo a sua essência. O capitalismo aproximou-se do
socialismo estatal e este absorveu os princípios do capitalismo. Ambos se
entendem muito bem.
Não obstante, o socialismo livre
continua conservando o seu valor revolucionário e transformador. O certo é que
já não se pode conceber o socialismo como um sistema cerrado e perfeito, capaz
de converter o inferno capitalista em um estado de coisas paradisíaco. O
socialismo estatal é a corrupção das idéias socialistas. Nada se perderá quando
as instituições opressoras se eliminam e quando o bem-estar geral aumenta sem o
estabelecimento do socialismo estatal.
O processo emancipador da
humanidade não se cumprirá com a criação de novas instituições estatais, e sim
muito melhor, mediante a desconfiança nas autoridades estatais e nos dirigentes
políticos profissionais. O socialismo libertário oferece fórmulas de solução
singelas e concretas: controle direto e permanente da economia pelos produtores
e consumidores; estrita e ininterrupta vigilância da vida publica por todos os
cidadãos; iniciativa do povo em vez da intervenção dos governos.
A liberdade e o socialismo não
são realidades que possam surgir de decisões governamentais. Devem ser
conquistadas e vividas. Só florescerão e se desenvolverão se soubermos
defendê-las diariamente, na criação e na luta.
Por Agustin Souchy,
A Plebe (São Paulo), 1 de dezembro de 1950, número
29, página 3.
O texto me faz refletir uma conversa que tive com um grande amigo Edvado a questão das manifestações e apesar de reconhecer sua importância fico na duvida qual ganho esses movimentos tem de concreto para a questão da transformação social se não avançar na direção de outras formas mais horizontais de organização? não sera um espetáculo que ira mudar a ordem das coisas, afinal no dia seguinte a propriedade privada e tudo ao que a ela esta relacionado se matem da mesma forma. se manifestar é super importante porem precisamos ir alem e nos organizar de forma não reproduzia aquilo que tantos criticamos, do contrario só mudam os donos do poder, só mudam as moscas porque todo o mais continuara igual.
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